A falta de medicamentos disponíveis para pacientes usuários da rede pública de saúde em Biguaçu vem fazendo muita gente perder o sono e a paciência. Os que dependem de manter a medicação sob pena de correr risco de morrer, acabam tendo que arcar com a despesa do próprio bolso, o que termina estourando o orçamento de qualquer aposentado ou trabalhador. A situação, que geralmente dura apenas alguns dias até que o estoque seja restabelecido, desta vez parece ter se perpetuado por três semanas. Pior que isso, ainda não há previsão de quando o problema será sanado em definitivo.
Na semana que passou a Secretaria Municipal de Saúde de Biguaçu anunciou a compra de R$ 73 mil em medicamentos. Segundo o secretário Angelo Ramos Vieira, os materiais começaram a chegar na segunda-feira (23), sendo distribuídos durante a semana nas 18 unidades de saúde da cidade. A única exceção seria a 19º, o Posto do bairro Bom Viver, que segue fechado para reformas.
O valor liberado pela Pasta, no entanto, não deverá saciar o déficit de remédios nas prateleiras das salas onde funcionam as farmácias em cada unidade. Ângelo confirmou que a despesa mensal com medicamentos em Biguaçu era de R$ 400 mil, em média, ou seja, muito acima dos R$ 73 mil.
O desaparecimento dos remédios das unidades de saúde se deve à crise econômica, como explicou Ângelo. Segundo ele, o Governo Federal teria cortado repasses destinados à reposição de medicamentos. Para se tentar aplicar com alguma coerência os R$ 73 mil, Ângelo garante ter promovido uma pesquisa para se detectar quais as maiores emergências, apontando as prioridades, como medicamentos para coração, pressão e diabetes.
Há pouco mais de dois anos, a administração municipal formalizou uma parceria com a iniciativa privada, com a intenção de escapar da necessidade de se promover licitações para a compra de remédios. A medida costuma tornar o processo de compra menos burocrático, mas permite que ocorram aquisições a preços acima do mercado, sem burlar a Lei. A privatização do atendimento de saúde, repetindo o que ocorreu em Biguaçu, tem provocado protestos e impasses em diversos estados e municípios brasileiros.
A solução, em 2013, foi uma parceria com a ONG ISEV, Instituto de Saúde e Educação Vida. A entidade recebe direto os repasses do Governo Federal, e administra sozinha o atendimento básico de saúde. Além de ser a responsável pela compra dos medicamentos, também é a empresa que contrata médicos, enfermeiros e demais profissionais de saúde em Biguaçu.
A parceria entre Prefeitura e a ONG ISEV fez de Biguaçu a cidade pioneira no modelo de gestão público-privada, mas os resultados disso não tem sido nada satisfatórios. O convenio livrou a Prefeitura da responsabilidade de gerir a saúde na cidade, mas permitiu um acúmulo de irregularidades trabalhistas, que vem sendo discutidas na Justiça, entre empregados e patrões, como vem denunciando o Sintramubi, sindicato que reúne os servidores municipais em Biguaçu. A crise se acentuou e passou a afetar diretamente a população quando os remédios começaram a sumir das prateleiras.
Os usuários do sistema, moradores de Biguaçu, seguem peregrinando entre as unidades atrás dos medicamentos que necessitam. Em todos os postos, não são apenas os remédios considerados mais caros que seguem em falta, como captopril (para pressão), vitaminas, oratadina, sinvastatina, metformina, solbutamol e omeprazol. Também não se encontra os mais simples, como paracetamol, insulina tamiran, soro fisiológico, dipirona (analgésico) e amoxicilina (anti-inflamatório). A situação parece ser ainda pior na Policlínica (antigo Mini-hospital do Rio Caveiras, Posto do Saveiro e posto do Centro.
Por conta da parceria com a Prefeitura, a ONG Isev chega até mesmo a representar o município em eventos que discutem a saúde pública, como no 23º Simpósio das Unimeds do Estado do Paraná (SUESPAR), onde a diretora técnica do Instituto Saúde e Educação Vida, enfermeira Raquel Cúrcio, representou Biguaçu.
Na época, Raquel definiu como um “privilégio” poder representar Biguaçu entre autoridades no assunto. Segundo ela, os debates colocaram a cidade em “destaque nacional”, enquanto milhares de pacientes começavam a agonia provocada pela falta de remédios.