Depois das merecidas “férias” no Carnaval, parlamentares retornam a Brasília
Presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira e Presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco, na abertura do ano legislativo. — Foto: Bruno Spada / Câmara dos Deputados.
Apesar de o ano legislativo já ter começado oficialmente, o Congresso Nacional retoma seu ritmo normal de trabalho somente a partir desta semana. A tradicional cerimônia de abertura dos trabalhos, com salva de tiros de canhão e discurso dos presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), aconteceu no dia 5 de fevereiro. Após o evento, porém, poucos parlamentares circularam nos corredores do congresso.
DEPOIS DO CARNAVAL
Agora, após a pausa prolongada de Carnaval, a expectativa é que os parlamentares voltem a discutir e votar também às pautas prioritárias deste ano, entre elas a regulamentação da inteligência artificial (IA) e questões importantes para o governo como a regulamentação da reforma tributária.
O calendário, no entanto, está apertado. Devido às eleições municipais de 2024, espera-se que em julho as duas Casas sofram um esvaziamento, pois deputados e senadores devem voltar as atenções às campanhas nos municípios.
Uma possibilidade aventada por parlamentares para aumentar o quórum nas sessões é de que os presidentes da Câmara e do Senado flexibilizem a necessidade da presença física e adotem o sistema híbrido de votação nesses períodos.
REGULAMENTAÇÃO DA REFORMA TRIBUTÁRIA
A regulamentação da reforma tributária é uma das prioridades do governo para este ano. Tanto Lira quanto Pacheco já sinalizaram que desejam dar foco à discussão.
ENTENDA EM 7 PONTOS A REFORMA TRIBUTÁRIA
A reforma foi aprovada em 2023 e unifica cinco tributos em dois Impostos sobre Valor Agregado (IVAs) — um gerenciado pela União, e outro com gestão compartilhada entre estados e municípios: Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS): com gestão federal, vai unificar IPI, PIS e Cofins; Impostos sobre Bens e Serviços (IBS): com gestão compartilhada estados e municípios, unificará ICMS (estadual) e ISS (municipal).
COMO A REFORMA TRIBUTÁRIA VAI SIMPLIFICAR A DEFINIÇÃO DE PREÇOS
Apesar de já definir regras, alguns pontos da reforma precisam ser regulamentados, como os tratamentos diferenciados e setores com alíquotas reduzidas. A reforma estabelece prazos para que o governo envie esses projetos ao Congresso — parte em março e outra até junho deste ano. Na primeira etapa, por exemplo, o Planalto deve encaminhar até março duas propostas: reforma da tributação da renda; e reforma da tributação sobre a folha de salários.
Em mensagem ao Congresso, na abertura dos trabalhos, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) destacou a promulgação da reforma como um “feito extraordinário” do Congresso.
– Em conjunto com os esforços do Executivo, ambas as Casas conseguiram criar as bases para um novo modelo tributário muito mais racional, justo e eficiente – afirmou Lula.
No documento, o governo classifica a reforma como um “marco” da gestão petista e sinaliza que os esforços de 2024 do Planalto serão voltados para a regulamentação do texto.
– O governo dialogará com o Congresso Nacional para construir a segunda etapa da reforma tributária, focando na tributação sobre a renda”.
RELAÇÃO COM O STF
No retorno da folga, o Congresso também pode se debruçar sobre propostas que alteram competências e o funcionamento do Supremo Tribunal Federal (STF). A pauta é patrocinada pela oposição ao governo Lula e recebeu sinalizações de apoio do presidente do Senado no início do mês.
Em discurso no último dia 5, Rodrigo Pacheco defendeu a discussão da proposta que cria mandatos para ministros da Corte. Pacheco mencionou a proposta como uma pauta para combater “privilégios”.
– Também combateremos privilégios e discutiremos temas muito relevantes, como decisões judiciais monocráticas, mandatos de ministros do Supremo Tribunal Federal e reestruturação de carreiras jurídicas, considerando as especificidades e a dedicação exclusiva inerentes ao Poder Judiciário – declarou.
Um dia depois, na primeira sessão deliberativa do Senado, Pacheco sinalizou que havia apoio de líderes para que o texto fosse votado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa.
– Outra medida que propusemos no colégio de líderes e que também foi aceita – não por unanimidade, mas pela maioria – para ser deliberada na Comissão de Constituição e Justiça, é a que define mandatos da limitação do tempo de permanência dos ministros do STF. É uma medida absolutamente honesta, sob o ponto de vista da discussão, defendida por inúmeros juristas, inclusive muitos ex-ministros do Supremo que defenderam essa tese – afirmou o senador.
A proposta que cria mandato fixo para ministros da Corte está travada na CCJ. O texto, apresentado pelo senador Plínio Valério (PSDB-AM), estabelece um mandato de oito anos para os magistrados, sem direito à recondução.
A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) também diminui a idade máxima para entrada de membros da Corte para 65 anos. Atualmente, podem ocupar uma vaga no STF brasileiros com idade entre 35 e 70 anos. Ainda pela regra atual, os ministros têm mandato vitalício, com aposentadoria compulsória aos 75 anos. Ministros da Corte, como o decano Gilmar Mendes, têm criticado a discussão da PEC no Senado.
Além da proposta de Valério, outras duas PECs, também travadas na CCJ, discutem a criação de um mandato para ministros da Corte. Uma das propostas, apresentada pelo senador Angelo Coronel (PSD-BA), limita o mandato de ministros do STF a oito anos, mas prevê a possibilidade de uma recondução, além de elevar para 55 anos a idade mínima para integrar o STF.
Outro texto, de autoria do senador Flávio Arns (PSB-PR), eleva a idade mínima para nomeação à Corte para 50 anos e cria um mandato de 15 anos, sem direito à recondução.
Senado tem projetos que alteram regras para nomeação e duração de mandatos dos ministros do STF. — Foto: Reprodução.
Além dessas PECs, a CCJ do Senado também está pronta para votar um outro texto, apresentado por Pacheco, que proíbe o porte e posse de qualquer tipo de droga, independentemente da quantidade. O texto é uma reação da Casa ao avanço do STF em um julgamento que pode descriminalizar a posse e porte de maconha.
Na Câmara, a oposição articula a retomada de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que acaba com o foro por prerrogativa de função — popularmente conhecido como foro privilegiado — para congressistas em crimes comuns.
A PEC já foi aprovada pelo Senado e aguarda apreciação da Câmara desde 2018. O texto, na prática, tira do Supremo Tribunal Federal (STF) a competência para julgar casos que envolvem parlamentares em delitos como roubo, lavagem de dinheiro e corrupção. Com isso, eles seriam julgados pela primeira instância, no local em que cometerem o crime.
A oposição enxerga na proposta uma forma de evitar investigações coordenadas pelo Supremo. Além desse texto, a Câmara também pode discutir a PEC que restringe decisões monocráticas na Corte. O texto já foi aprovado pelo Senado, mas enfrenta resistência entre lideranças da Câmara.
Código Eleitoral
O Senado pretende avançar, segundo Rodrigo Pacheco, na aprovação de propostas que modificam as regras das eleições. Pacheco tenta destravar a discussão de um novo Código Eleitoral. O texto deve reunir mudanças aprovadas pela Câmara na chamada minirreforma eleitoral e pode servir de pano de fundo para que o presidente do Senado paute uma de suas propostas prioritárias: o fim da reeleição.
Presidente do Senado tenta destravar a discussão de um novo Código Eleitoral. — Foto: Alejandro Zambrana e Antônio Augusto/Secom TSE.
As duas Casas também esperam discutir — ainda no primeiro semestre — uma proposta que regulamente a inteligência artificial no país. A tecnologia foi destaque nos discursos de Lira e Pacheco na abertura dos trabalhos do Congresso.
REFORMA ADMINISTRATIVA
Ao longo deste ano, o presidente da Câmara quer trazer de volta à pauta a reforma administrativa, que altera as regras para os futuros servidores dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário da União, estados e municípios. O texto foi aprovado pela CCJ da Casa em 2021 e por uma comissão especial, e está pronto para ser votado no plenário principal da Câmara. A proposta atual, que foi enviada pelo governo do então presidente Jair Bolsonaro (PL), é criticada por membros do governo Lula.
Ministra da Gestão e da Inovação, Esther Dweck, durante reunião interministerial entre MGI, MF e MPO. — Foto: Adalberto Marques/MGI.
Em setembro de 2023, por exemplo, a ministra da Gestão e Inovação, Esther Dweck afirmou que o governo discute uma reforma administrativa, mas não nos termos defendidos por Lira.
Segundo o blog do Valdo Cruz no g1, o governo já se prepara para discutir a proposta na retomada dos trabalhos no Congresso. A avaliação é que a participação do Planalto poderá evitar que o governo seja “atropelado” nas negociações.
Por Beatriz Borges, Kevin Lima, g1 — Brasília