Primordial nos sets de filmagem dos Estados Unidos Canadá e na Europa desde 2018, o coordenador de intimidade tem a função de estabelecer protocolos para atrizes e atores de se sintam seguros e confortáveis nas cenas de sexo de filmes e séries. Esvaziar o set ou garantir que os atores possam se despir com privacidade são pequenas mudanças que esses profissionais conseguiram para coibir possíveis abusos físicos ou psicológicos, que começaram a vir à tona com o movimento #MeToo, em 2017. O trabalho começa na leitura do roteiro, evolui para ensaios e se estende até o dia das filmagens. Mulheres são maioria nessa função.
“ Todo mundo tem uma imagem diferente na cabeça sobre o que uma cena ‘quente’ poderia ser. Então, converso com o diretor e pergunto: ‘Quanta nudez você vê? Que posições imagina?’ Depois, falo com os atores: ‘Isso é o que queremos. Como se sentem?’ Entramos em muitos detalhes, porque artistas tendem a dizer ‘sim’ (para tudo) . Temos uma conversa muito aberta em que eles podem colocar limites”, diz a canadense Casey Hudecki, que trabalhou com intimidade em “The Handmaid’s tale”, “American gods” e “Mrs. America”.
Este ofício ganhou notoriedade em Hollywood em 2018, por conta da série “The Deuce”, que retrata o submundo do sexo na Nova York dos anos 1970. No papel de uma prostituta que vira uma estrela de filmes pornôs, a atriz Emily Meade pediu aos executivos da HBO uma pessoa no set para ajudá-la nas cenas de maior exposição. Eles, então, contrataram Alicia Rodes, ex-dublê e também coreógrafa de luta que, em 2016, fundara a Intimacy Directors International, uma organização criada para estabelecer diretrizes sobre cenas de sexo no teatro e em produções audiovisuais.
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No Brasil, essa função inexiste. Na falta de um profissional com este papel definido por aqui, a responsabilidade fica nas costas dos diretores. Acostumada a rodar cenas quentes, a diretora Julia Rezende acha interessante pensar por que essas profissionais se tornaram necessárias.
“Mostra que temos um ambiente em que atrizes não se sentem tão seguras. Afinal, filmamos sexo e nudez desde que o cinema existe”, afirma Julia, que trabalha de forma semelhante ao olhar que as coordenadoras tentam implementar. “Não acredito em imposição, sobretudo em cenas de intimidade. Os atores estão ali para construirmos juntos”.
Julia Acaba de rodar o longa “A porta ao lado”, repleto de cenas de sexo e até uma de masturbação feminina protagonizada por Letícia Colin. A atriz diz que se sentiu segura ao ser guiada por ela. No entanto, afirma que vai lutar para que a presença da coordenadora de intimidade vire uma realidade nos sets brasileiros. Maeve Jinkings também vive essa expectativa. Ela brinca que, quando há um roteiro com muitas cenas de sexo ou nudez, “fica orando às deusas do audiovisual para que o diretor tenha sensibilidade” para conduzir o processo.