ONDA DE CALOR: COBRANÇA DE TAXA PARA USO DE AR-CONDICIONADO EM CARROS DE APLICATIVOS GERA POLÊMICA

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Cobrança “por fora” ou qualquer outra negociação no valor da corrida são proibidas pelas empresas que oferecem o serviço

Quem recorre ao serviço de transporte por aplicativo e pede ao motorista para ligar o ar-condicionado já deve ter ouvido uma dessas respostas: “está quebrado”, “não está incluído nesta categoria” ou, o que é ainda mais surpreendente, “será cobrada uma taxa extra”. Com o Rio em meio à nova onda de calor, esse comportamento, mais para o calorento do que para o caloroso, provoca justa indignação nos usuários. A cobrança “por fora” ou qualquer outra negociação no valor da corrida em troca de refresco nestes dias de altas temperaturas são proibidas pelas empresas que oferecem o serviço.

As regras vigentes não impediram a advogada Karina Bruno de penar com o calor durante uma viagem na terça-feira passada. Dentro do carro que havia pedido, ao deparar com o aviso pendurado atrás do banco do carona, ela resolveu desabafar nas redes sociais: o motorista da categoria X da Uber, que geralmente oferece a menor tarifa, informava em comunicado que cobrava taxa extra, por quilômetro rodado (R$ 0,50, e um mínimo de R$ 5), para ligar o ar-condicionado durante as corridas. É verdade esse bilhete: o cartaz esclarecia ainda que o pagamento poderia ser feito via PIX. O protesto da advogada, que deu entrevista ao site G1, incentivou outras reclamações de clientes. Imagens de plaquinhas, cobrando valores entre R$ 1 e R$ 5 — algumas já com o QR code — viralizaram.

IMAGEM MANCHADA

Rodando pela mesma empresa há um ano e sete meses, o motorista Carlos Cezar, de 32 anos, repudia a ação de alguns colegas. Ele conta que a prática, além de ilegal, “mancha a imagem dos que trabalham corretamente nesta categoria mais econômica”.

— Antes da pandemia, todas as categorias da Uber eram obrigadas a circular com o ar-condicionado ligado, independentemente do valor da corrida ou do destino do passageiro. Acho errado que motoristas cobrem taxas por fora. Daqui a pouco, os passageiros revoltados com isso vão deixar de andar na categoria X, migrando para a categoria comfort, que, mesmo sendo mais cara, obrigatoriamente oferece ar condicionado nas viagens. Isso mancha a imagem dessa categoria mais econômica — opinou o motorista.

Carlos Cezar diz que, nos dias em que consegue rodar sem ar condicionado, costuma abastecer o carro com até R$ 100 de gasolina e trabalha cerca de 12 horas. Quando o calor aumenta e é necessário deixar o ar ligado o dia inteiro, ele afirma gastar R$ 50 a mais com combustível.

Fernando Castro Pinto, professor do Departamento de Engenharia Mecânica da Escola Politécnica da UFRJ, faz uma conta mais precisa. Ele diz que o gasto de combustível, com o ar desligado ou ligado, pode variar de 0,5 a 1,5 km/l, aproximadamente. Ou seja, um carro que faz 10km/l passaria, com a refrigeração acionada, para algo entre 9,5 e 8,5 km/l. Há outras variáveis a se levar em conta, como o trânsito enfrentado e o estilo de direção do motorista. Com o ar ligado, o consumo pode aumentar de 5% a 15%, calcula o professor.

— O ar-condicionado funciona a base de energia. No caso do carro essa energia vem toda do consumo de combustível. O mesmo vale para carros a gás, gasolina, álcool e diesel — explica o engenheiro Fernando Castro Pinto.

Em uma corrida do Aeroporto Santos Dumont até o Hospital Souza Aguiar, no Centro, O GLOBO encontrou um motorista de aplicativo que pediu “caixinha de natal” para ligar o ar-condicionado. A “caixinha” propriamente dita, era de papelão e ficava em cima do banco do carona. Bastava “depositar um valor”, sugeriu o motorista.

— A atitude desses motoristas que cobram taxas é controversa. Imagine o seguinte: o valor da corrida não cobre o consumo do ar condicionado. Mas também não cobre o consumo do pneu, revisão do veículo, do motor. Então não faz sentido. As empresas deveriam rever suas políticas de pessoal, contratando motoristas qualificados para a categoria, justamente para não constranger o passageiro. — opina o professor Fernando Castro Pinto.

Nos últimos dias, O GLOBO percorreu pontos das zonas Sul e Norte do Rio e constatou que a cobrança indevida é mais comum do que se imagina. A escritora Bruna Paiva, de 25 anos, lembrou que, em novembro, pegou uma corrida de R$ 24,90 de Olaria até o Méier, ambos bairros da Zona Norte. Com os vidros do carro abertos, o motorista perguntou se ela queria que o ar fosse ligado. Ela aceitou, mas logo em seguida ele puxou de um compartimento atrás do banco do carona um papel que dizia: “Em caso de ar ligado será cobrada uma taxa de R$ 3 sobre o valor da corrida”.

— Lembro que estava fazendo muito calor. Estava indo para a casa de uma amiga e quando cheguei lá tive que tomar outro banho. Achei um absurdo ele cobrar pelo ar. Fomos derretendo de calor, mas não paguei. Fiquei com medo de reagir à situação porque estava sozinha no carro. No final da corrida, dei três estrelas para ele no aplicativo — contou Bruna.

Empresas como a Uber e a 99 esclarecem que o ar-condicionado faz parte dos requisitos para o cadastro de automóveis nas plataformas. E que diversificam o serviço oferecido por categorias para melhor atender os clientes. Em uma corrida de Uber do Centro a Copacabana, num trajeto de dez quilômetros, o valor cobrado na categoria comfort, em que os motoristas usam o ar condicionado, pode chegar a R$41,06 — na X, que geralmente circula apenas com as janelas abertas, o preço cai para R$ 29,96.

Esta reportagem foi realizada no Rio de Janeiro, mas ela vale para todo o Brasil, pois hoje os veículos de transporte de passageiros por aplicativo estão por toda a parte.

Por Jéssica Marques

 

 

Redação
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