Lideranças da Serra catarinense defenderam na noite desta sexta-feira (29), no auditório da Associação Empresarial de Lages (Acil), que no Código Estadual do Meio Ambiente esteja claro prevalência à Lei da Mata Atlântica para evitar conflitos como está ocorrendo há três anos entre os produtores e o Ibama, que notificou com embargos e multas 30 produtores rurais do local, na operação batizada de “Campereando”. Eles também defenderam que se possa implantar um plano de manejo da Araucária, que permita além da coleta de pinhão, a utilização da madeira de forma sustentável nas propriedades rurais e a caça ao javali, considerado uma praga ambiental, entre outras sugestões.
As propostas foram apresentadas na quarta audiência pública realizada para discutir e propor alterações à Lei 14.675/2009, que trata do Código Estadual do Meio Ambiente, realizadas desde quinta-feira (28). O evento faz parte de um ciclo de oito audiências públicas promovidas pela comissão mista formada na Assembleia Legislativa com o objetivo de promover uma revisão na normativa. Na abertura do evento a equipe técnica apesentou a metodologia da elaboração da revisão, que já conta com mais de 500 sugestões de alterações e aperfeiçoamento do código ambiental.
Foi lembrado que o código catarinense foi pioneiro no Brasil servindo de modelo para o nacional e que, devido à inclusão de diversos novos decretos, portarias e instruções normativas referentes ao tema desde a sua implementação, há 12 anos, é necessária a sua atualização. As propostas estão sendo incluídas separadamente entre os 26 capítulos e 296 artigos do atual Código Ambiental. As propostas mais sugeridas até o momento estão relacionadas ao licenciamento ambiental, envolvendo principalmente as licenças para cascalheiras, prazos de licenciamento e licenciamento autodeclaratórias, além de APPs urbanas e pagamentos dos serviços ambientais.
Nos primeiros pronunciamentos realizados foram sugeridos convites para participação de entidades de defesa do meio ambiente e da agricultura familiar, além de inclusão de artigos que fortaleçam a agricultura ecológica. O secretário de Desenvolvimento de Água Doce, Marino Souza Pinto, apresentou a preocupação do seu município, que conta com 1.800 quilômetros de estradas e muitas delas com árvores como araucária, que não podem ser cortadas, coibindo a ampliação destas estradas para atender os maquinários dos produtores rurais. “Que seja incluído um artigo que possibilite esse corte.”
Conflito com o Ibama
O presidente do Sindicato Rural, Márcio Pamplona, fez um relato do problema de conflito com o Ibama. “Há três anos fiscais do Ibama do Rio Grande do Sul atuaram na região da Coxilha Rica e notificaram com embargos e multas 30 produtores rurais do local, na operação batizada de “Campereando”. Nas justificativas das autoridades ambientais, a proteção do bioma Campos Sulinos, sendo que as áreas fiscalizadas estariam na condição de vegetação secundária em estado inicial de degeneração e demais descumprimentos da legislação ambiental.”
De acordo com ele, apesar de várias reuniões e até apoio do presidente nacional do Ibama, além de lideranças empresariais e políticas do estado, as multas ainda estão sendo cobradas pelos técnicos do órgão em total desrespeito com a legislação estadual. Ele também defendeu a caça ao javali, considerada uma praga ambiental, além de criticar a polícia ambiental militar que deveria, em sua opinião, orientar primeiro antes de multar os agricultores.
O ex-deputado federal Ivan Ranzolin defendeu a permissão do manejo sustentável do pinus e das araucárias. “Há vários estudos que defendem o manejo sustentável desta riqueza, atualmente as árvores estão caindo de velhas.” O ex-deputado estadual Gabriel Ribeiro também criticou o Ibama e alertou que se Santa Catarina não defender sua legislação todo o estado sofrerá e perderá o direito de legislar em seu território. Para Ribeiro, a ação dos fiscais do Ibama gaúcho foi ilegal e estaria coibindo os agricultores catarinenses de produzirem em suas propriedades.
O secretário da Agricultura de São José do Cerrito, Antônio Carlos Paes de Oliveira, também defendeu que seja permitido o manejo sustentável do pinus e das araucárias. “O nosso município é essencialmente agrícola e está difícil sobreviver não podendo cortar essas árvores, remanejando-as para outros locais, como forma de ampliar as áreas de plantio.” O assessor ambiental da Acil, Alexandre Silva, afirmou que o problema da operação “Campereando” do Ibama gaúcho não envolve apenas os 30 agricultores da Serra, pois é um problema de estado. “Se os técnicos do Ibama vencerem a agricultura catarinense será inviabilizada.”
A deputada federal Carmen Zanotto (Cidadania) sugeriu que a Alesc promova uma audiência pública envolvendo técnicos e especialistas do Paraná e do Rio Grande do Sul para discutir o manejo sustentável das araucárias. “Temos que avançar nestes estudos e no Código Ambiental para viabilizar economicamente e ambientalmente de forma que permita, além da coleta de pinhão, a utilização da madeira de forma sustentável nas propriedades.” Ela também falou da operação “Campereando”, avaliando como um conflito que precisa ser resolvido pelo Código Ambiental para evitar a insegurança jurídica dos agricultores. “Essa novela ainda não terminou e a resolução não é fácil, por isso precisamos dar segurança jurídica aos agricultores com o Código Ambiental.”
O prefeito de Lages, Antônio Ceron (PSD), lembrou que participou como deputado na elaboração do Código Ambiental catarinense há 12 anos. Defendeu a preservação do meio ambiente e ao mesmo tempo o desenvolvimento econômico do estado. “Tem que haver um equilíbrio.” Também defendeu um fortalecimento do código, com um artigo, que dê segurança aos agricultores para evitar conflitos como ocorre com os fiscais do Ibama. “Santa Catarina é um estado de pequenos agricultores, mas que são grandes produtores e eles precisam desta segurança jurídica para continuarem a trabalhar.”
Em seguida, o vice-presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Santa Catarina (Faesc), Enori Barbieri, falou do histórico da decisão de rever o código ambiental, que “foi inchado de portarias e resoluções”, modificando o texto original da lei. Elogiou a iniciativa do deputado Valdir Cobalchini (MDB), presidente do colegiado, e do presidente da Alesc, deputado Mauro de Nadal (MDB), em agilizar as audiências públicas. “É preciso que a gente defina por lei aquilo que o agricultor tem que fazer e obedecer. Indicar o que o órgão ambiental vai fazer e qual órgão ambiental o correto para fiscalizar. É lógico que precisamos de fiscalização, mas dentro da coerência. O produtor rural não é contra o meio ambiente, muito pelo contrário.”
Ele também defendeu a inclusão de um artigo que defina o código ambiental catarinense em prevalência à Lei da Mata Atlântica. “A lei tem que ser clara e não podemos deixar que ninguém venha ao nosso estado interferir nas nossas decisões. Não podemos permitir essa agressão do Ibama nacional e quem tem que legislar sobre o nosso estado é a Alesc.”
A diretora-executiva da Federação Catarinense dos Municípios (Fecam), Sisi Blind, destacou a importância das audiências e explicou que a entidade acompanhará todas as oito previstas. “O meio ambiente é a nossa casa e se nós não cuidarmos da casa, ela vai ruir. Compactuamos com uma menor burocracia para agilizar os procedimentos”. Ela enfatizou que seria importante incutir um olhar educativo, provocando uma maior conscientização ambiental. De acordo com ela, a previsão é de o Código ficar pronto ainda este ano.
O presidente do Sindicato dos Produtores de Madeira da Região Serrana, Paulo César da Costa, o Costinha, também defendeu a prevalência do Código Ambiental catarinense à Lei da Mata Atlântica como forma de acabar com a insegurança jurídica, falou da importância de um artigo que permita o manejo das araucárias e dos pinus, que permitirá o fortalecimento da economia do estado e a preservação do meio ambiente. Enfatizou ainda a importância do combate ao javali no estado, que estaria prejudicando a agricultura. O presidente do Sindicato Rural de São José do Cerrito, Zito Bittencourt, também defendeu o manejo sustentável das araucárias.
O presidente do Instituto do Meio Ambiente (IMA) de Santa Catarina, Daniel Vinícius Netto, enalteceu a iniciativa da Assembleia Legislativa em revisar o Código Ambiental e assegurou que a entidade vai apresentar suas sugestões após ouvir as demandas nas oito audiências públicas. Sobre o conflito com o Ibama, lembrou que o IMA desde o início se posicionou em defesa da legislação catarinense e continua com sua posição firme e clara.
O presidente do colegiado e autor da proposta de revisão do código, deputado Valdir Cobalchini (MDB), avaliou a audiência de Lages como uma das mais concorridas e com fortes depoimentos. Assegurou que levará o tema do conflito com o Ibama à Procuradoria Geral do Estado, ao governador Carlos Moisés e à Alesc. Disse ainda que foi acertada a decisão de estabelecer o modelo de consulta às regiões. “Por todas essas repercussões, estamos ainda mais convencidos da forma com que conferimos a todas as macrorregiões a oportunidade de dar as suas contribuições.”
Tramitação da revisão
A previsão do colegiado, que também é integrado pelos deputados Milton Hobus (PSD), relator; José Milton Scheffer (PP), vice-presidente; Moacir Sopelsa (MDB) e Fabiano da Luz (PT), é que a apresentação do relatório final sobre a revisão do código ambiental aconteça no dia 23 de novembro e que a votação em plenário ocorra no dia 21 de dezembro.
Próximas audiências
11/11- 9 h – Rio do Sul
11/11 – 16 h – Joinville
12/11 – 9 h – Içara
18/11 – 10h – Assembleia Legislativa