Excesso de exposição à internet e redes sociais, além de mudanças nos hábitos, relacionamentos e vida social, também pode comprometer a morfologia do cérebro, causando prejuízos no processamento de recompensas e de regulação emocional
O uso de telas é hábito da grande maioria da população. No Brasil, 87,6% da população com 10 anos ou mais tinha um aparelho de telefone celular em 2023, de acordo com o IBGE. São notórios os benefícios que a internet proporciona no dia a dia, facilitando desde o trabalho, ensino, até compras, interações com amigos e parentes e pagamentos de contas, usando apenas o celular. O problema acontece quando não há equilíbrio entre o tempo diante de telas e o gasto em outras atividades, como convivência com a família e social, atividades físicas e outras necessárias de todo ser humano. De acordo com o Relatório Digital 2024: 5 billion social media users, publicado em parceria entre We Are Social e Meltwater, o Brasil é o segundo país em que os usuários passam mais tempo on-line, com média de 9 horas e 13 minutos, atrás apenas da África do Sul com 9 horas e 24 minutos.
Para a psicóloga Bárbara Couto, especialista e Relacionamentos tudo depende da forma como a internet é usada. “Sabemos que as redes sociais funcionam usando algorítmos, entregando conteúdos que nos interessam e prendendo nossa atenção. Com isso, ficamos tempo demais e acabamos abrindo mão de outras coisas que são importantes, trocando a vida social pela internet. Muitos passam a ter queda de desempenho escolar ou profissional, pais passam a ficar mais ausentes, amigos mais distantes, entre outras consequências”, informa Bárbara. E essas informações acendem um alerta no Brasil, já que outro ponto abordado na pesquisa é que brasileiros ocupam a terceira posição no tempo gasto em redes sociais, com usuários dedicando, em média 3 horas e 37 minutos diariamente.
Uso excessivo da internet pode viciar, assim como o álcool e drogas
Ao trocar a vida social pela internet, a produção do hormônio ocitocina e dos neurotransmissores dopamina e serotonina, que é equilibrada na interação social passa a ser substituída por uma produção imediata, o que causa dependência e isolando mais ainda a pessoa. “Os estudos mostram que o uso excessivo dessas tecnologias resulta em sintomas de dependência química, como os da dependência alcoólica ou da dependência de jogos, por exemplo. O efeito é comparado ao de vício mesmo, que pode afetar várias áreas das vidas das pessoas”, explica a psicóloga.
E os efeitos do uso excessivo de tela podem afetar mais os nativos digitais, aqueles que já nasceram na era digital. São indivíduos que já vieram ao mundo conectados, que não conheceram a realidade sem internet e têm suas habilidades e comportamentos moldados pelas tecnologias e a internet. Eles são muito mais dependentes, imediatista e multitarefa que as outras gerações. “Os nativos digitais não desenvolveram habilidades que as gerações anteriores tinham, como se forçar para ler um livro, ter atenção à leitura e ao que o outro fala, desenvolvendo melhor a memória. Hoje, as informações chegam muito rápido em vídeos curtos, em áudios acelerados, ensinando ao cérebro a ter pouquíssima atenção a um texto grande, a conversas longas, prejudicando também a memória. Sem repertório, há prejuízos no desenvolvimento da linguagem e da escrita, na capacidade de resolução de problemas e na ansiedade”, aponta Bárbara Couto.
Pressão social e de mídias sociais interferem na saúde emocional
A pressão por sucesso e conquistas e por uma vida perfeita, mostrada nas redes sociais também interferem diretamente na saúde mental. Os jovens são expostos a padrões irreais de beleza, sucesso e felicidade. Muitos influenciadores digitais demonstram que conquistar o que eles têm ou são é fácil, que precisa apenas se esforçar. Isso pode levar quem os segue a uma série de problemas psicológicos, como ansiedade, depressão, autoestima e sensação de fracasso. “A imaturidade emocional dessa fase faz com que eles acreditem que precisam ser como os influencers. Os jovens precisam de um modelo e, nessa geração tão conectada, influencers podem exercer esse papel. E isso pode gerar sentimento de inadequação, insuficiência, baixíssima autoestima, ansiedade, depressão, porque são padrões que pouquíssimos conseguem alcançar ou quase ninguém, já que as redes sociais mostram uma perfeição que a humanidade não tem”, alerta a psicóloga.
Mudança na estrutura física do cérebro
Além da mudança de hábitos e nas relações, o uso excessivo de telas também está causando alterações morfológicas no cérebro, reduzindo a substância cinzenta e mudando as conectividades entre as áreas responsáveis pelo processamento de recompensa e de regulação emocional. “Isso prejudica o córtex pré-frontal, provoca o aumento do déficit cognitivo e da ansiedade, dificulta a regulação da emoção, do processamento da linguagem, da tomada de decisão e do controle dos impulsos”, afirma a psicóloga.
Crianças devem ter uso de tela limitado e monitorado
Hoje, é comum ver pais mostrando celular para crianças, ainda bebês, com desenhos e clipes infantis. Mas, com tantos prejuízos pelo uso excessivo de telas, a prevenção deve começar cedo. A recomendação da Sociedade Brasileira de Pediatria é o uso limitado e monitorado das telas. Até os dois anos, deve-se evitar exposição às telas, sem necessidade, pois é a principal época de formação do cérebro, quando o uso de telas pode ser mais danoso. Entre dois e cinco anos, a exposição às telas deve ser de, no máximo, uma hora por dia, sempre com supervisão. As crianças entre seis aos 10 anos podem ficar entre uma a duas horas diante das telas, também sob supervisão de responsável. Entre 11 e 18 anos, a exposição às telas não deve passar de três horas. “Não só as crianças devem limitar o uso de telas. Adultos também devem se policiar, principalmente limitar o próprio uso de redes sociais, que oferecem recursos para que isso seja feito. É preciso parar e analisar se o uso de telas está prejudicando alguma área da vida, traçar metas para melhorar e aplicar o que se propôs a fazer. Lembrando sempre que somos seres sociais e precisamos estar com pessoas, conviver pessoalmente. E as redes sociais não substituem a relação pessoal”, finaliza Bárbara Couto.
Por Chris Coelho Comunicação e Assessoria de Imprensa
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