Maduro não gostou o veto do Brasil à entrada da Venezuela no Brics
Nicolás Maduro, presidente da Venezuela. Imagem: Maxwell Briceno/REUTERS.
A Venezuela afirmou nesta quinta-feira (24) que o veto do Brasil à entrada do país no Brics “constitui uma agressão” e um “gesto hostil” contra o território liderado por Nicolás Maduro.
O QUE ACONTECEU?
A manifestação ocorreu por meio de um comunicado assinado por Yván Gil Pinto, ministro de Relações Exteriores da Venezuela. O texto foi divulgado em espanhol e português. O Itamaraty informou que não vai comentar oficialmente a declaração.
Comunicado agradeceu ao presidente russo, Vladimir Putin, pelo convite feito a Maduro para participar da Cúpula do Brics. Liderada em 2024 pelo Kremlin, a aliança teve sua cúpula realizada nesta semana, na cidade russa de Kazan. Além de russos e iranianos, fazem parte do bloco: África do Sul, Arábia Saudita, China, Índia, Egito, Etiópia, Emirados Árabes Unidos e Brasil. Como apurado pelo colunista do UOL, Jamil Chade, a Venezuela chegou a aparecer entre os países com significativo apoio na corrida para fazer parte do grupo.
No texto, o país apontou que não é apenas a maior reserva energética do mundo. Eles indicaram que também possuem uma “bandeira de valores, de princípios e a visão de construção de um mundo justo, multicêntrico e pluripolar”, e ressaltaram que contaram com o respaldo e apoio de outros países na cúpula para a formalização da sua entrada no bloco. Além da Venezuela, a Nicarágua foi excluída da lista prévia que define os países candidatos a parceiros no bloco.
A Venezuela afirmou que a decisão do Brasil “contraria a natureza e postulado dos Brics”. O comunicado destacou que a medida mantém o veto que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) aplicou ao país “durante anos”. Citando nominalmente o representante da chancelaria brasileira no encontro, na figura do embaixador Eduardo Paes Saboia, o país acusou o veto de reproduzir “o ódio, a exclusão e a intolerância promovida desde os centros de poder ocidentais para impedir, por enquanto, a entrada da Pátria de Bolívar na organização”.
A decisão brasileira constitui uma agressão contra a Venezuela e um gesto hostil que se soma à política criminosa de sanções impostas contra um povo corajoso e revolucionário, como o povo venezuelano. A Venezuela agracia o Sul e o Leste global com a sua firmeza na defesa da autodeterminação e da igualdade soberana dos Estados. Nenhum estratagema ou manobra concebida contra a Venezuela interromperá o curso da história. Nasce um novo mundo! A Venezuela faz parte deste mundo livre sem hegemonismos.
COMUNICADO DA VENEZUELA
No fim do texto, o país voltou a apontar que o povo venezuelano “sente indignação e vergonha com esta agressão inexplicável e imoral da chancelaria brasileira (Itamaraty)”. Eles ainda acusaram o governo brasileiro de “manter a pior das políticas de Jair Bolsonaro contra a Revolução Bolivariana fundada pelo Comandante Hugo Chávez”.
O país ainda declarou que a cúpula foi um “sucesso retumbante”. “Felicitamos o Presidente Putin e o seu governo pelas suas contribuições extraordinárias, nas palavras do El Libertador Simón Bolívar, para o equilíbrio universal”.
Em entrevista à imprensa na cúpula, Maduro disse que a Venezuela “está há duzentos anos no Brics”. Em vídeo compartilhado pelo partido dele, o presidente se apresenta para a opinião pública venezuelana como parte do bloco e cita “superpotências” como a China, Índia e a Rússia, e potências emergentes, como Irã, Turquia e Arábia Saudita. Ele não menciona o Brasil na declaração, nem falou sobre como se deu a eleição na Venezuela.
MANIFESTAÇÃO É VISTA COM PREOCUPAÇÃO PELO GOVERNO BRASILEIRO
Integrantes do governo brasileiro receberam a declaração da Venezuela com preocupação. Conforme apuração do colunista do UOL Jamil Chade, o esforço do país é ainda o de ser um interlocutor entre a oposição e o regime. Mas o veto e agora a resposta de Caracas são considerados como fatores que podem afastar essa possibilidade para o governo Lula.
Ao mesmo tempo, o Palácio do Planalto considerava que o preço a ser pago pela adesão da Venezuela, principalmente com eleições municipais pelo país, seria elevado.
Numa ala do governo brasileiro, a atitude de Vladimir Putin de convidar Maduro para o evento foi visto com surpresa. Diplomatas do Itamaraty que estavam em Kazan não foram informados sobre a viagem e uma lista de convidados que circulou entre as delegações não incluía o presidente venezuelano.
Oficialmente, a Presidência do Brasil não comenta a atitude de Caracas. O Itamaraty também informou que não vai comentar oficialmente a declaração da Venezuela.
O UOL apurou que o governo da Venezuela ainda ficou irritado com parceiros regionais que, apesar do veto brasileiro, aceitaram o convite para aderir ao Brics. O Brasil defendeu a entrada de Bolívia e Cuba. Nenhum desses países eram as preferências do Itamaraty para a adesão. O Brasil queria Colômbia e Angola. Mas ambos declinaram do convite de Lula.
Beatriz Gomes e Jamil Chade – Do UOL, em São Paulo, e colunista do UOL, em Nova York