ARTIGO: 7 de Setembro, Soberania Popular e a constitucionalidade da Anistia de 8 de Janeiro

Atos de 8 de Janeiro se enquadram em diversos crimes previstos no Código Penal e no Código Penal Militar

O 7 de Setembro, data em que o Brasil reafirma sua independência e soberania, não pode ser sequestrado por discursos que deturpam a essência da democracia. A soberania popular, fundamento constitucional, encontra limites na ordem jurídica e nos princípios que sustentam o Estado Democrático de Direito.

Nos últimos meses, tem ganhado corpo a narrativa de que os condenados pelos atos de 8 de janeiro poderiam ser beneficiados por uma anistia ampla. Contudo, essa tese ignora a Constituição da República. O artigo 5º, §44, é cristalino: “constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático” (BRASIL, 1988).

Essa previsão não é uma norma comum. Trata-se de cláusula pétrea, imutável até mesmo por emenda constitucional. Assim, qualquer tentativa de extinguir condenações relacionadas a ataques contra o Estado democrático – como os ocorridos em 8 de janeiro – esbarra em um limite absoluto imposto pelo próprio texto constitucional.

OS CRIMES E AS LEIS APLICÁVEIS

Os atos de 8 de janeiro de 2023 se enquadram em diversos crimes previstos no Código Penal, no Código Penal Militar e em legislações especiais, todos compatíveis com o disposto no art. 5º, §44, da CF/88:

  • Abolição violenta do Estado Democrático de Direito (CP, art. 359-L) → reclusão de 4 a 8 anos, além da violência (BRASIL, 1940).
  • Golpe de Estado (CP, art. 359-M) → reclusão de 4 a 12 anos, além da violência (BRASIL, 1940).
  • Interrupção do processo eleitoral (CP, art. 359-N) → reclusão de 3 a 6 anos e multa (BRASIL, 1940).
  • Comunicação enganosa em massa para fins eleitorais (CP, art. 359-O) → reclusão de 1 a 5 anos e multa (BRASIL, 1940).
  • Terrorismo (Lei nº 13.260/2016) → reclusão de 12 a 30 anos (BRASIL, 2016).
  • Associação criminosa armada (CP, art. 288-A) → reclusão de 1 a 3 anos, aumentada se houver uso de armas (BRASIL, 1940).
  • Organização criminosa armada (Lei nº 12.850/2013) → reclusão de 3 a 8 anos e multa (BRASIL, 2013).
  • Revolta (CPM, art. 149) → reclusão de 8 a 20 anos (BRASIL, 1969).
  • Motim (CPM, art. 150) → reclusão de 4 a 8 anos (BRASIL, 1969).
  • Conspiração (CPM, art. 152) → reclusão de 3 a 8 anos (BRASIL, 1969).

A IMPOSSIBILIDADE DA ANISTIA

O Supremo Tribunal Federal (STF), guardião da Constituição, já consolidou em suas decisões que os atos daquele dia configuraram ataques diretos à democracia e à separação dos Poderes, enquadrando-se na tipificação do art. 5º, §44. Portanto, não há espaço para indulgência jurídica. O que se tenta vender como “perdão” nada mais é do que uma afronta à soberania popular, expressa no voto e na Constituição.

A ANISTIA COMO ABOLIÇÃO DA CONSTITUIÇÃO

Em tese, a aprovação de uma anistia aos crimes de 8 de janeiro equivaleria à abolição da Constituição brasileira em seu núcleo essencial e à revogação indireta das leis ordinárias que tipificam tais crimes e definem suas penas. Isso porque:

  • violaria uma cláusula pétrea, que não pode ser alterada nem por emenda constitucional;
  • esvaziaria o conteúdo de leis penais como o Código Penal, o Código Penal Militar e legislações especiais (Lei de Terrorismo e Lei de Organizações Criminosas), tornando-as letra morta.

Portanto, qualquer projeto de anistia dessa natureza não seria apenas inconstitucional, mas juridicamente inexistente, por ferir o núcleo imutável da Constituição e corroer as bases do Estado Democrático de Direito.

O verdadeiro 7 de Setembro não é o da retórica de impunidade, mas o da reafirmação de que a independência nacional e a liberdade só existem quando a lei vale para todos. A anistia, neste caso, não é apenas impossível: seria um suicídio constitucional.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm.

BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848.htm.

BRASIL. Decreto-Lei nº 1.001, de 21 de outubro de 1969. Código Penal Militar. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del1001.htm.

BRASIL. Lei nº 12.850, de 2 de agosto de 2013. Define organização criminosa e dispõe sobre a investigação criminal. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/lei/l12850.htm.

BRASIL. Lei nº 13.260, de 16 de março de 2016. Regulamenta o disposto no inciso XLIII do art. 5º da Constituição Federal, definindo o crime de terrorismo. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2016/lei/l13260.htm.

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José Santana

Jornalista, pós-graduado em Direito Constitucional

Redação
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