Os trinta e sete anos da nossa Constituição promulgada em 1988
Promulgada em 05 de outubro de 1988, a Constituição Federal do Brasil representou o marco do renascimento democrático após duas décadas de regime militar. Conhecida como “Constituição Cidadã”, consolidou princípios fundamentais como a soberania popular, a dignidade da pessoa humana e o Estado Democrático de Direito. Trinta e sete anos depois, a Carta Magna enfrenta novos desafios: a polarização política, a ausência de regulamentação de dispositivos essenciais e as tentativas de enfraquecer direitos e garantias constitucionais. O presente artigo analisa a gênese histórica da Constituição de 1988, seus principais atores políticos com destaque ao deputado constituinte catarinense Luiz Henrique da Silveira e os dilemas contemporâneos da sua efetividade.
A promulgação da Constituição Federal de 1988 marcou o encerramento do ciclo autoritário iniciado em 1964. No plenário do Congresso Nacional, o então presidente da Assembleia Nacional Constituinte, Ulysses Guimarães, declarou com veemência:
“Temos ódio à ditadura. Ódio e nojo. Amamos a liberdade. A Constituição certamente não é perfeita, mas é a melhor que poderíamos ter” (BRASIL, 1988, p. 12).
Assim, nascia a chamada Constituição Cidadã, símbolo do retorno da soberania popular e da institucionalização dos direitos fundamentais no Brasil contemporâneo.
A GÊNESE DA CONSTITUIÇÃO DE 1988
A Assembleia Nacional Constituinte (1987–1988) foi convocada após o processo de redemocratização, conduzido pelo governo de José Sarney e impulsionado pela mobilização social das “Diretas Já”.
Composta por 559 parlamentares, a Constituinte recebeu mais de 60 mil emendas populares, refletindo uma das maiores participações civis da história republicana (CABRAL, 1998).
Entre os constituintes, destacou-se o papel do deputado catarinense Luiz Henrique da Silveira (PMDB-SC), jurista e político de formação humanista, que defendeu o fortalecimento do pacto federativo, a autonomia dos municípios e a inclusão de instrumentos de controle democrático e transparência.
Sua atuação parlamentar foi decisiva para a consolidação de dispositivos sobre planejamento regional, cooperação federativa e iniciativas de modernização administrativa, que mais tarde inspirariam sua gestão como governador de Santa Catarina (SILVEIRA, 2004).
O ESPÍRITO DA “CONSTITUIÇÃO CIDADÔ
A Constituição de 1988 inovou ao consagrar princípios como a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III), a função social da propriedade, o direito à educação e à saúde e a criação de instituições autônomas de controle, como o Ministério Público e a Defensoria Pública (BRASIL, 1988).
Essa nova ordem jurídica substituiu o Estado autoritário por um Estado Democrático de Direito, comprometido com a promoção da justiça social e a proteção dos direitos individuais e coletivos.
Por essas razões, Ulysses Guimarães denominou-a “Cidadã”, em reconhecimento ao protagonismo popular e à restauração da cidadania plena.
OS DESAFIOS CONTEMPORÂNEOS
Três décadas após sua promulgação, a Carta de 1988 enfrenta tensões estruturais e políticas. A polarização ideológica e a desinformação digital vêm corroendo a confiança nas instituições democráticas.
Além disso, inúmeros dispositivos constitucionais carecem de regulamentação efetiva, impedindo a concretização de direitos fundamentais — como a reforma tributária justa, a valorização do serviço público e a efetividade do pacto federativo.
Mais preocupante, contudo, são as tentativas de relativizar as cláusulas pétreas, que protegem os direitos e garantias individuais, o voto direto, a separação dos poderes e a forma federativa de Estado. Tais investidas representam ameaças diretas ao núcleo intangível da Constituição (MENDES; BRANCO, 2023).
A DEFESA PERMANENTE DO ESTADO DE DIREITO
Defender a Constituição de 1988 é dever cívico e moral de cada cidadão. Como afirma Canotilho (2003, p. 45), “a Constituição é o espelho da sociedade e o fundamento do poder legítimo”.
A Carta Magna sobrevive enquanto o povo a protege. Toda violação de direitos, toda tentativa de instrumentalização do Judiciário, ou de supressão de liberdades, constitui um atentado contra o pacto fundacional da República.
CELEBRAR SEUS 37 ANOS É REAFIRMAR O COMPROMISSO COM OS VALORES QUE A SUSTENTAM:
Respeito, compromisso, lealdade e honra.
Esses princípios não são apenas virtudes morais, mas condições de sobrevivência da democracia constitucional brasileira.
A “Constituição Cidadã” de 1988 permanece como o símbolo maior da reconstrução democrática. Seus fundamentos, soberania popular, direitos humanos e justiça social — continuam sendo o norte jurídico e ético da Nação.
No entanto, a democracia exige vigilância constante, pois os inimigos do Estado de Direito não desaparecem: apenas mudam de forma e discurso.
A defesa intransigente da Constituição é, portanto, o verdadeiro ato de patriotismo.
REFERÊNCIAS
- BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília: Senado Federal, 1988.
- CABRAL, Bernardo. A Constituinte de 1988: memória e testemunho. Brasília: Senado Federal, 1998.
- CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 6. ed. Coimbra: Almedina, 2003.
- MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2023.
- SILVEIRA, Luiz Henrique da. Reflexões sobre a Constituinte e o pacto federativo. Florianópolis: Assembleia Legislativa de Santa Catarina, 2004.
Por José Avelino Santana
Jornalista e pós-graduado em Direito Constitucional
Folha do Estado: Edição Especial — Outubro de 2025