Nesta coluna, toda a semana uma história diferente
Entre o pó da terra e a luz das estrelas, cada ser humano carrega um segredo silencioso: somos corpo e alma. O corpo é matéria – nosso invólucro. A alma é a essência que se nutre e amadurece como a semente que guarda dentro de si a vida. O corpo é a cápsula que protege e, ao mesmo tempo, alimenta esse núcleo sagrado.
Algumas sementes amadurecem rápido, rompem a terra com força quase imediata. Outras pedem tempo: o invólucro resiste, exige uma transição longa, uma troca de nutrientes que desgasta e, pouco a pouco, deixa a casca se desfazer. Mas em cada uma há o mesmo propósito: nutrir a alma, fortalecer a centelha que é de Deus.
Existem também as sementes que parecem defeituosas. À primeira vista, frágeis ou manchadas, muitas carregam cicatrizes do ambiente em que caíram, da falta de água, do frio excessivo ou de tempestades que as feriram. Ainda assim, dentro delas pulsa uma energia misteriosa. Algumas surpreendem: mesmo com o invólucro rachado ou deformado, encontram força para absorver o pouco que têm, transformando carência em potência. Outras precisam de cuidado redobrado – um solo mais acolhedor, uma luz mais paciente – para que a alma encontre nutrientes suficientes e, enfim, floresça. E mesmo quando não germinam no tempo que esperamos, cumprem uma função silenciosa, fertilizando o caminho de outras sementes com a sabedoria de sua própria luta.
Assim somos nós. Enquanto a matéria se desgasta, a alma absorve tudo – cada alegria, cada dor, cada aprendizado. Esse é o húmus da nossa caminhada. E quando a maturação chega, o invólucro do corpo cede. A alma, com equilíbrio e temperança, se desprende e se integra ao Todo, tornando-se parte viva do universo.
Aquilo que aqui chamamos de morte é, na verdade, Glória. Não é perda, é retorno. A centelha se funde ao que é infinito, ao que é Deus. Nada se apaga: o que parecia fim é apenas o início de uma existência maior.
Somos, sim, como sementes. Há as vigorosas, as pacientes e as que carregam defeitos visíveis ou invisíveis. Cada uma tem sua história, seu ritmo, sua missão. E quando compreendemos que esse desprendimento é passagem e não vazio, a tristeza dá lugar a uma paz profunda. A alma, agora sem limites, participa do Todo – única e eterna – feita da mesma essência do Criador.
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Por Virgílio Galvão – De Brasília