ARTIGO: A BANDEIRA DE ISRAEL E OS POLÍTICOS NA MARCHA PARA JESUS

Marcha para Jesus desta quinta-feira em São Paulo foi pródiga em presença de políticos

A presença marcante de bandeiras de Israel na Marcha para Jesus, realizada em São Paulo nesta quinta-feira, chama atenção e levanta questões importantes, especialmente em se considerando que o Estado de Israel – assim como o judaísmo tradicional – não reconhece Jesus como o Messias ou filho de Deus, como crê o cristianismo. Essa aparente contradição pode ser explicada por alguns fatores simbólicos, teológicos e políticos.

LIGAÇÃO ESPIRITUAL E BÍBLICA

Para muitos evangélicos, especialmente os de orientação neopentecostal, Israel representa a “terra santa”, berço do cristianismo e palco de eventos bíblicos centrais. Eles acreditam que a nação de Israel faz parte das promessas de Deus ao povo escolhido e que a restauração do Estado moderno de Israel é um sinal do cumprimento das profecias do fim dos tempos. Assim, mesmo que os judeus não reconheçam Jesus como o Messias, os evangélicos os veem como parte de um plano maior de salvação previsto na Bíblia.

APOIO POLÍTICO-RELIGIOSO

Nos últimos anos, houve uma aproximação estratégica entre setores evangélicos brasileiros e o Estado de Israel, incentivada por líderes religiosos e até por políticos que não raras vezes se aproveitam da situação. O apoio incondicional a Israel virou uma espécie de “bandeira” da fé e da identidade cristã conservadora. Carregar a bandeira de Israel, portanto, também pode ser uma demonstração pública de aliança e afinidade ideológica, especialmente num contexto onde política e religião se misturam.

INFLUÊNCIA DOS EUA E DA TEOLOGIA DISPENSACIONALISTA

Grande parte do evangelismo brasileiro é influenciado por correntes protestantes dos Estados Unidos, onde a chamada teologia dispensacionalista defende a restauração de Israel como nação e a conversão futura dos judeus como eventos fundamentais do Apocalipse cristão. Nessa visão, apoiar Israel seria quase uma obrigação para os “cristãos fiéis”.

FALTA DE CONHECIMENTO TEOLÓGICO PROFUNDO

É possível também que muitos dos que carregam a bandeira de Israel o façam mais por simbolismo ou repetição cultural, sem se aprofundar nas diferenças doutrinárias entre o cristianismo e o judaísmo. Para esses fiéis, a bandeira pode representar genericamente o “povo de Deus” ou uma forma de “consagrar” o evento á Deus, sem maiores reflexões teológicas.

Em resumo, a presença da bandeira de Israel na Marcha para Jesus não está ligada ao reconhecimento mútuo entre as religiões, mas sim a uma visão simbólica, profética e político-religiosa dos grupos evangélicos que veem Israel como parte essencial do seu universo de fé – ainda que os próprios judeus não compartilhem da mesma crença sobre Jesus.

PRESENÇA DE POLÍTICOS NA MARCHA

Já a presença do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, e do prefeito da capital paulista, Ricardo Nunes, enrolados em bandeiras de Israel durante a Marcha para Jesus levanta um debate importante sobre os limites entre fé e estratégia política.

Por um lado, é inegável que o evento tem uma forte conotação religiosa, pois ele reúne milhares de evangélicos e tem como foco principal a celebração da fé cristã, com destaque para Jesus Cristo. Dentro desse universo, o apoio a Israel se tornou, ao longo dos anos, um símbolo comum entre diversos segmentos evangélicos, principalmente aqueles ligados ao neopentecostalismo, que veem no Estado de Israel uma peça central da escatologia cristã (o “fim dos tempos”) e um elo espiritual com as raízes bíblicas do cristianismo.

Por outro lado, não se pode ignorar o peso político de gestos como esse. Envolver-se com bandeiras de Israel diante de um público majoritariamente evangélico é também uma sinalização política clara, pura. Tarcísio e Nunes, ambos em ano pré-eleitoral (o governador mirando uma candidatura à Presidência do País, e o prefeito, inclusive, já mirando uma possível candidatura ao governo do estado), sabem da força eleitoral do segmento evangélico, especialmente em São Paulo. A associação com símbolos que ressoam fortemente nesse grupo pode ser vista como uma tentativa de reforçar laços com essa base, ou seja, sim, pode haver fé, mas há também, muito possivelmente, politicagem na presença deles.

Em resumo: o gesto pode até ter raízes sinceras na fé pessoal de cada um, mas, no contexto político atual, é impossível descolar esse tipo de ação de um cálculo estratégico. A bandeira de Israel, ali, pode representar tanto um símbolo religioso quanto uma ferramenta de marketing político.

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Por L. Pimentel

Redação
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