CONTO: A Barroquinha – O Belo Engano da Natureza

Os contos são assim. Numa manhã a agente acorda e diz: “ah!, mas era só um conto” e a gente sorri de si mesma

Há belezas que encantam não apenas o olhar, mas também o imaginário. Entre elas, há um pequeno ponto de fascínio que atravessa gerações, inspira poetas e faz corações se perderem em um sorriso: a barroquinha na bochecha. Essa leve depressão que surge quando alguém sorri – o famoso “furinho” – sempre foi vista como símbolo de charme, pureza e graça. No entanto, por trás de tanta delicadeza, esconde-se uma curiosa imperfeição anatômica, uma falha sutil na harmonia dos tecidos faciais que a ciência, com sua precisão fria, se encarregou de revelar.

O que se chama carinhosamente de barroquinha nada mais é do que uma depressão causada por uma variação anatômica do músculo zigomático maior, estrutura responsável por elevar o canto da boca ao sorrir. Em alguns indivíduos, esse músculo não se insere de maneira uniforme, dividindo-se em dois feixes: um segue seu trajeto natural, enquanto o outro se prende mais superficialmente à pele. O resultado? Uma retração cutânea momentânea que, ao movimento do sorriso, cria a ilusão de um “furinho” encantador.

Do ponto de vista embriológico, trata-se de uma falha no processo de fusão muscular durante o desenvolvimento da face, ainda no período intrauterino. Ou seja, um pequeno “defeito” de formação – inofensivo, é verdade, mas anatomicamente irregular. A biologia, em sua ironia silenciosa, deu forma ao que o coração humano chamou de beleza.

E é curioso notar como aquilo que nasce de um erro se transforma em padrão de desejo. Artistas e amantes, desde o Renascimento, exaltaram o encanto das bochechas marcadas. No cinema, atrizes como Sophia Loren e Cameron Diaz eternizaram essa imperfeição como um traço irresistível de sedução. Já na ciência, os anatomistas a classificam como uma anomalia congênita benigna, uma pequena “falha estética” que, por ironia, enriquece o rosto de naturalidade e simpatia.

Mas o que seria da beleza se a explicássemos demais? Há algo de mágico na ignorância do detalhe técnico – pois, ao descobrir que o traço que nos cativa é fruto de um erro embrionário, o encanto se esvai como perfume ao vento. O amor, que antes se acendia num sorriso singelo, passa a ver apenas fibras musculares que não se fundiram.

E assim, entre a poesia e a anatomia, entre o fascínio e a razão, resta-nos escolher: admirar a barroquinha como um milagre do acaso, ou compreendê-la como uma imperfeição disfarçada de beleza.

Talvez a verdade esteja em ambos os lados. Pois a natureza, sábia e contraditória, parece divertir-se em provar que, às vezes, é do erro que nasce o amor.

NOTA DO AUTOR: Esta crônica integra a série ‘Belezas Imperfeitas’, que aborda curiosidades científicas sobre os traços humanos e a poética que há na anatomia.

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Por Virgílio Galvão – De Brasília

 

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