Quando as publicações ultrapassam os limites
A coluna publicada no jornal O Globo, ao atribuir a fontes não identificadas a alegação de que o ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes teria buscado encontros com o presidente do Banco Central para tratar de assuntos relacionados ao Banco Master, ultrapassa um limite sensível, não político, mas jurídico e institucional.
Não se discute aqui a liberdade de imprensa. Ela está assegurada, consolidada e protegida pela Constituição Federal. O que se discute é algo mais grave: o uso do prestígio de um grande veículo de comunicação para lançar suspeitas, sem prova, capazes de atingir reputações, tensionar instituições e produzir efeitos públicos irreversíveis.
FONTE ANÔNIMA NÃO É SALVO-CONDUTO PARA INSINUAR IRREGULARIDADES
O sigilo da fonte existe para proteger o jornalista, não para blindar versões frágeis ou narrativas especulativas. Quando uma colunista sugere que um ministro da Suprema Corte teria agido de forma imprópria, ainda mais em contexto de escândalo financeiro, o ônus da prova não pode ser substituído por meros relatos de bastidores.
Insinuações que não vêm acompanhadas de documentos, registros oficiais, agendas formais ou qualquer elemento minimamente verificável não configuram jornalismo investigativo. Configuram, isto sim, risco jurídico assumido.
A CONSTITUIÇÃO NÃO AUTORIZA LINCHAMENTO REPUTACIONAL
A Constituição Federal é clara e inequívoca: a liberdade de expressão não anula a proteção à honra, à imagem e à dignidade. Nenhuma autoridade pública perde seus direitos fundamentais pelo simples fato de ocupar cargo relevante.
O Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça já firmaram entendimento pacífico no sentido de que, quando a imprensa extrapola o dever de informar e passa a sugerir condutas ilícitas sem base factual mínima, há abuso. E abuso gera responsabilidade. Não se exige prova de má-fé. Basta a constatação do excesso.
RESPONSABILIDADE CIVIL É REAL E SOLIDÁRIA
É ilusório sustentar que colunas opinativas estejam imunes à responsabilização jurídica. Não estão. O veículo de comunicação responde solidariamente pelo conteúdo que publica, inclusive em espaços de opinião.
Se ficar demonstrado que a publicação causou dano à honra, associou indevidamente um agente público a escândalo ou careceu de diligência jornalística básica, o dever de indenizar surge como consequência jurídica natural, e não como censura.
O RISCO PENAL NÃO É FICÇÃO JURÍDICA
Embora o Direito Penal seja a última ratio, imputações indiretas e insinuadas não escapam automaticamente da tipicidade penal. A jurisprudência é clara ao afirmar que não é necessário imputar de forma explícita. Insinuar pode ser suficiente, a depender do contexto. A forma sutil de acusar não torna o ato juridicamente inofensivo.
O VERDADEIRO DANO: A CORROSÃO INSTITUCIONAL
O problema maior, porém, não é apenas jurídico. É institucional. Quando um grande jornal opta por publicar versões sem lastro probatório robusto envolvendo um ministro do STF e o Banco Central, o dano extrapola o indivíduo e alcança o funcionamento das instituições.
Esse tipo de publicação afeta diretamente a confiança no Judiciário, compromete a credibilidade do sistema financeiro e, paradoxalmente, atinge a própria imprensa.
O jornalismo que flerta com o sensacionalismo de bastidor pode até gerar impacto imediato, mas perde autoridade moral no médio e longo prazo.
IMPRENSA LIVRE EXIGE IMPRENSA RESPONSÁVEL
Uma democracia sólida não se sustenta nem com censura, nem com acusações difusas travestidas de jornalismo. Sustenta-se com informação verificável, contraditório efetivo e responsabilidade editorial. Quando esses pilares são relativizados, a liberdade deixa de ser instrumento democrático e passa a ser pretexto para o excesso.
A crítica aqui não é ideológica, nem pessoal. É jurídica. E é necessária.
Liberdade de imprensa não é licença para insinuar o que não se pode provar.
Fonte anônima não substitui evidência.
Reputações não são dano colateral aceitável do jornalismo.
Quem informa sem prova assume o risco.
E, no Estado de Direito, todo risco tem consequência.
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Da redação




























