Assembleia Geral da ONU ocorre no dia 23 de setembro
Quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva subir ao púlpito da sala da ONU para abrir a Assembleia Geral, no próximo dia 23 de setembro, uma das principais mensagem que irá mandar é a de que seu governo rejeita qualquer questionamento por parte de potências estrangeiras. Num dos eixos de seu discurso estará a palavra: ‘soberania’.
Instantes depois, quem tomará o mesmo lugar é o presidente dos EUA, Donald Trump, o segundo a falar. E, uma vez mais, será a palavra “soberania” que ecoará pelo salão.
O que a ONU irá presenciar, segundo diplomatas de ambos os países, é uma disputa entre os dois líderes, cada qual defendendo o seu conceito de soberania, de liberdade de expressão, do destino da Palestina, do clima e de visão de mundo.
Se a cúpula das Nações Unidas foi sempre marcada por tensões entre delegações, os organizadores destacam que, neste ano, o clima é “especialmente difícil” por conta de a programação ter, já em sua abertura, dois líderes em plena crise política.
Ambos usarão a mesma sala, antes de subir para o pódio. Num contexto normal na diplomacia, as duas delegações não teriam problemas em se cruzar, como de fato já ocorreu em diversas oportunidades. Mas com a tensão em alta, a ordem por enquanto no serviço de protocolo da entidade é a de organizar as comitivas para que os dois presidentes sequer estejam no mesmo lugar, ao mesmo tempo.
Lula, segundo fontes do Itamaraty, usará o discurso em uma sala lotada para marcar os 80 anos da ONU para mandar um recado de que nem o Brasil e nem potências emergentes pelo mundo estarão dispostas a serem chantageadas ou atacadas, numa alusão aos EUA.
A soberania, portanto, é a recusa em aceitar qualquer ingerência em assuntos domésticos, como fez Trump diante do julgamento de Jair Bolsonaro por golpe de estado.
O Palácio do Planalto acredita que Lula não estará sozinho na defesa da soberania. Um recente projeto da China sobre o que acredita quer a ordem internacional coloca também o respeito pela soberania como um dos pilares.
Governos como o da África do Sul, fortemente atacado por Trump, e mesmo países europeus que temem o abalo causado pelo americano, também apontarão para o fato.
Na ONU, o próprio secretário-geral, António Guterres, vem alertando sobre os riscos de medidas unilaterais que enfraquecem o sistema multilateral e o direito internacional.
Trump também deve fazer referências ao termo soberania. Mas com uma conotação radicalmente diferente e um objetivo que vai no sentido contrário ao que é defendido pela ONU, pelo Brasil ou pela China.
Para a Casa Branca, a soberania é a recusa em aceitar o direito internacional ou qualquer definição a partir de órgãos como a ONU, OMS ou qualquer instância que envolva o que a extrema direita denomina de “globalismo”.
Dorothy Shea, embaixadora dos EUA na ONU, revelou na semana passada quais seriam os principais pontos da agenda americana na Assembleia Geral e, confirmando a avaliação de governos estrangeiros, a “soberania” aparece entre as prioridades. Segundo ela, “os Estados Unidos acreditam firmemente que a soberania das nações é a base do sistema internacional”.
“A ONU deve respeitar a independência de seus Estados-membros e evitar impor regulamentações ou políticas onerosas que sufocam a inovação, impedem o crescimento econômico ou infringem a tomada de decisões nacionais”, afirmou.
LIBERDADE DE EXPRESSÃO X CENSURA
Outro ponto que aparece como prioridade para o governo Trump é a liberdade de expressão. “Os Estados Unidos sempre serão um defensor incondicional dos direitos naturais e inalienáveis”, avisou a embaixadora, ao apresentar as prioridades americanas na ONU.
“As liberdades de expressão, associação, reunião pacífica e religião não são apenas direitos – elas são a força vital de uma sociedade livre e aberta. Os Estados Unidos não tolerarão esforços para suprimir essas liberdades, seja por meio da censura governamental, do bloqueio da Internet ou do silenciamento da oposição política”, disse.
Neste aspecto, mais uma vez, o choque com o governo Lula parece inevitável. Lula avalia incluir em seu discurso a necessidade de que a democracia seja protegida, inclusive da manipulação e da disseminação de ódio e desinformação nas redes sociais. Para diplomatas, esse promete ser outro ponto de choque entre os dois líderes.
Trump chegou a abrir um processo nos EUA contra Alexandre de Moraes por conta de acusações de censura e vem suspendendo vistos de autoridades brasileiras com o mesmo argumento.
PALESTINA
Tampouco ficará de fora do discurso de Lula uma condenação pelas mortes em Gaza, um apelo pelo reconhecimento do estado palestino soberano e a insistência para que a comunidade internacional dê respostas. Trump, de seu lado, vai no sentido contrário. Na semana passada, diante de uma resolução na Assembleia Geral da ONU para estabelecer a necessidade da criação de um estado palestino, o governo americano foi um dos poucos a votar contra.
CLIMA
Lula ainda deve fazer uma convocatória para que líderes estejam presentes na Conferência do Clima, em Belém, no final do ano, com propostas ambiciosas. Trump, de seu lado, sequer enviará a delegação americana. Tanto a ONU como os demais governos aguardam até dia 23 de setembro para entender se existirá qualquer tipo de compromisso dos EUA com a questão climática, mesmo fora do Acordo de Paris.
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Por Jamil Chade – Uol De Genebra











