“A violação consciente de normas orçamentárias fundamentais pode configurar ato de improbidade doloso, ainda que não haja comprovação de enriquecimento ilícito. O dolo pode ser configurado diante da ciência do limite orçamentário e da decisão voluntária de extrapolá-lo”.
“O sistema jurídico-financeiro público brasileiro não se baseia na boa intenção do gestor, mas sim na efetiva obediência aos Comandos Legais.” ONG Olho Vivo
Entenda o caso:
No dia 23 de novembro de 2023, a Prefeitura de Itapema enviou ao presidente do Tribunal de Contas, o OFÍCIO Nº 204/2023 – GAB, com o seguinte teor:
“Cumprimentando-o cordialmente, diante da exigência do Banco do Brasil,
em Pedido de Verificação de Limites e Condições (PVL-02.003002/2023-35), junto a Secretaria do Tesouro Nacional, venho através do presente requerer expedição de certidão referente ao 5º bimestre do Município de Itapema (SC), relativo ao disposto no caput do art. 167-A da Constituição Federal, para o exercício em curso.”- grifamos.
A resposta do TCE/SC veio no dia 27 de novembro de 2023, através do PROCESSO Nº: @ADM 23/80124331, que menciona ao seu final o que segue:
“Em consulta aos dados remetidos pelo município de Itapema ao sistema e-Sfinge, apurados para o 5º bimestre de 2023, verificamos que no período de 12 (doze) meses a relação entre despesas correntes liquidadas, acrescidas dos restos a pagar não processados, e receitas correntes, ambas consolidadas, supera os 95% (noventa e cinco por cento), tendo atingido o percentual de 100,71% (cem vírgula setenta e um por cento), se enquadrando na hipótese de que trata o caput do art. 167-A da Constituição Federal, descumprindo, portanto, com o referido dispositivo constitucional, razão pela qual se aplicam ao município as restrições previstas no § 6º do artigo 167-A.- grifamos-.
Ressalva-se que os dados apurados se referem a exercício encerrado, porém ainda não apreciado por esta Corte de contas, bem como de exercício em curso, razão pela qual não dispensam o exame sobre a mesma matéria a ser feito oportunamente pelo Tribunal de Contas, face às competências que lhe são conferidas pela Constituição e pelas leis.”
Portanto, constatou-se a extrapolação do limite legal de gastos, o que ensejou medidas corretivas de ajuste fiscal de acordo com a legislação vigente,
No dia 24 de fevereiro do corrente, a ONG Olho Vivo enviou uma “DENÚNCIA CRIMINAL” à 3ª Promotoria de Justiça da Comarca de Itapema, onde, entre outras situações, pontuou:
“- Crime de responsabilidade – conforme o artigo 1º, inciso V, do Decreto-Lei nº 201/1967, que estabelece como crime de responsabilidade “ordenar ou efetuar despesas não autorizadas por lei, ou realizá-las em desacordo com as normas financeiras pertinentes”.
– Código Penal Brasileiro (Decreto-Lei nº 2.848/1940):
– Artigo 359-D: Crime de ordenação de despesa não autorizada.
– Artigo 359-F: Crime de assunção de obrigação no último ano do mandato sem disponibilidade de caixa.”
E sugeriu “a propositura da ação penal cabível contra a ex-prefeita, com base no Decreto-Lei nº 201/1967”.
A 3ª Promotoria de Justiça então abriu a NOTÍCIA DE FATO nº 01.2025.00017978-0, e o caso foi parar na Subprocuradoria-Geral de Justiça
Leia integra da decisão de arquivamento da Notícia de Fato: Lik – Arquivamento NF 01.2025.00017978-0 – Ex. Pref. Itapema
para Assuntos Jurídicos, aos cuidados do Exmo. Dr. Andreas Eisele, Subprocurador-Geral de Justiça para Assuntos Jurídicos que, no dia 30 de maio de 2025, determinou o arquivamento da Notícia de Fato.
A ONG Olho Vivo recebeu a comunicação do arquivamento, via email, no dia 09 de junho do corrente.
Então, a ONG Olho Vivo ingressou com uma contestação junto ao Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) contra o arquivamento da Notícia de Fato nº 01.2025.00017978-0, que investigava a ex-prefeita de Itapema por suposta violação do teto de gastos previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
Segundo a entidade, o arquivamento feito pelo Ministério Público foi baseado apenas nas medidas saneadoras adotadas pela ex-gestora após a constatação da irregularidade. A ONG argumenta, porém, que a violação já havia se consumado durante o mandato da ex-prefeita, configurando, assim, ilícito administrativo e orçamentário.
A ex-prefeita, conforme aponta a ONG Olho Vivo, ultrapassou os limites de gastos com pessoal estabelecidos pela LRF, o que fere diretamente os artigos 19 e 20 da lei. Apesar de o Ministério Público ter reconhecido a irregularidade nos autos, a justificativa para o arquivamento foi o fato de que a ex-gestora tomou medidas posteriores para equilibrar as contas públicas.
Para a ONG, esse entendimento representa um “grave retrocesso institucional” e um “perigoso precedente de leniência”. A organização ressalta que a responsabilização do agente público independe da adoção posterior de medidas corretivas, uma vez que o dano à ordem fiscal e à legalidade administrativa já estava consumado.
Além do aspecto financeiro, a ONG também critica o contingenciamento orçamentário adotado pela gestão à época, que teria deixado setores essenciais como saúde, educação e infraestrutura em situação de risco durante a vigência de um decreto municipal de restrição de gastos.
Na contestação, protocolada no último dia 11 de junho e encaminhada ao Subprocurador-Geral de Justiça para Assuntos Jurídicos, Dr. Andreas Eisele, a ONG pede o desarquivamento da notícia de fato, a instauração de inquérito civil público e uma análise aprofundada da conduta da ex-prefeita. A entidade também solicita que o caso seja comunicado ao Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina para as providências cabíveis.
“A impunidade administrativa, especialmente em matéria orçamentária e de finanças públicas, mina os fundamentos do Estado Democrático de Direito e abre espaço para a repetição de condutas semelhantes por outros gestores”, destacou Elias Costa Tenório, presidente da ONG Olho Vivo.
O Ministério Público de Santa Catarina ainda não se manifestou oficialmente sobre a contestação.
Leia recurso da Olho Vivo ao Sub-Procurador de para assuntos jurídicos do MPSC – Link OF.DIR. 017 2025 SUBPROCURADORIA MPSC