Tudo aconteceu por causa de um “churrasco”
Candidato pisou na bola, quis dar churrasco aos eleitores, mas saiu no prejuízo.
A juíza afirmou que a tentativa de enganar a justiça, apresentando o evento como uma festa de aniversário, agravou a situação devido à evidente má-fé. A decisão judicial que resultou na cassação de Zezinho da Associação (PL), que era candidato a vereador em Tijucas, trouxe à tona uma série de irregularidades eleitorais graves, conforme apontado pelo Ministério Público de Santa Catarina e destacado pela juíza Carolina Cantarutti Denardin. A petição inicial foi subscrita pelos advogados Fernando de Figueiredo Rodrigues e Gelciney Rodrigo Silvestre.
A acusação se baseia em uma entrevista concedida pelo principal cabo eleitoral do PL, Zezinho, ao Portal Top Elegance, no dia 30 de agosto, na qual ele anunciou o evento de lançamento de sua campanha para o dia 1º de setembro, no Bairro Nova Descoberta, em Tijucas.
Durante a entrevista, o candidato mencionou a realização de um churrasco gratuito, o que foi interrompido duas vezes por assovios, indicando que a fala não deveria ter sido feita. Mesmo assim, Zezinho continuou: “Vai ter um boi lá pra npois cume, e vamo…” disse referindo-se à grande quantidade de carne que seria servida aos presentes.
O evento político disfarçado de festa de aniversário foi realizado no sítio do atual presidente do Partido Liberal (PL) de Tijucas. De acordo com o Ministério Público, o evento constituiu abuso explícito de poder econômico, já que foi realizado um investimento aproximado de R$ 12.000,00.
– Desta forma, seja pelas próprias declarações truncadas das testemunhas, mas especialmente pelos vídeos anexados, extrai-se que o evento propagou a campanha eleitoral do requerido, uma vez que contava majoritariamente com adultos; estavam presentes outros apoiadores – inclusive o candidato a prefeito municipal -; foram tiradas diversas fotografias com o uso de adesivo de campanha e o sinal “V” de vitória; havia música de campanha e foi feito o uso da palavra, com microfone, pelo candidato.
A juíza afirmou que a tentativa de enganar a justiça, apresentando o evento como uma festa de aniversário, agravou a situação devido à evidente má-fé do candidato, em desrespeito às regras eleitorais:
– A tentativa de ludibriação, no ponto, impõe ao fato maior gravidade, dada a má-fé evidente, em desrespeito à ética que deveria conduzir a campanha eleitoral. Destaca-se que a prova oral inclusive prejudicou o requerido, uma vez que, além de evidenciar a tentativa de falsear a verdade, ainda comprovou números importantes para o deslinde da causa, como a quantidade de pessoas e os valores gastos, os quais permitiram concluir pela vultosidade do evento – citou a juíza de Tijucas.
A defesa do candidato tentou desqualificar o evento como uma reunião de campanha, apresentando-o como uma festa de aniversário para um adolescente de 16 anos, afilhado do responsável pela organização, supostamente sem relação com a candidatura de Zezinho. No entanto, a estratégia foi desmontada pelas provas apresentadas e pelas contradições nos depoimentos das testemunhas.
Primeiro, a juíza destacou que o organizador do suposto aniversário, que afirmou ter investido cerca de R$ 12.000,00 no evento, revelou não ter vínculo biológico com o adolescente e que ele nem sequer residia com o organizador, mas com outro apoiador da campanha, irmão do candidato.
– Destaca-se que, como constou da entrevista, “Tito”, presidente do partido, e “Dinho”, irmão do representado, auxiliariam o candidato na campanha, pois este mesmo afirma que “toda vida me ajudam” e que “esse churrasco que vai ser feito lá vai ser o Dinho e o Tito que vão fazer lá, botar um boi lá pra nós comer – detalha a sentença.
A juíza também condenou a ‘tentativa de ulteriormente atribuir essas despesas e organização do evento a terceiro’:
– É facilmente percebida e desconstruída, uma vez que não guarda nem sequer verossimilhança. Ocorre que não é crível a organização de evento para 300 pessoas para comemorar aniversário de 16 anos de adolescente com quem não tem vínculo biológico e, embora aduza possuir vínculo afetivo, verificou-se que nem mesmo reside com o depoente. Ademais, não se pode olvidar que a testemunha declarou trabalhar com reciclagem. Se não bastasse, nas imagens do evento acostadas pela representante não se verifica nenhuma alusão a festa de aniversário – bolo, parabéns, decoração ou etc. – e a defesa, por sua, vez, também nenhuma imagem acostou nesse sentido, o que seria fácil comprovar, já que houve diversos registros do evento. Além disso, não se pode olvidar que o evento ocorreu na propriedade de “Dinho”, irmão do representado, mesmo local anunciado por este na aludida entrevista – destacou.
O Tribunal Superior Eleitoral já pacificou entendimento de que, para configurar o abuso de poder, não é necessário provar que a ação alterou o resultado final das eleições, mas sim a gravidade e a desproporcionalidade dos atos em relação à disputa eleitoral. Com isso, a sentença proferida determinou a cassação do registro de candidatura do réu e sua inelegibilidade por 8 anos, garantindo que a integridade do processo eleitoral seja preservada.
A gravidade do caso, evidenciada pelos argumentos do Ministério Público e pela análise da juíza, ressalta a necessidade de se manter a equidade e a lisura no processo eleitoral, punindo exemplarmente qualquer tentativa de manipular a vontade popular por meio de recursos financeiros ou outros benefícios.
Matéria publicada pelo Jornal Razão